Tremembé: Série do Prime Video recria cotidiano do 'presídio dos famosos' com consultoria de ex-detentos

postado por: Antonio José | em 5 novembro 2025 Tremembé: Série do Prime Video recria cotidiano do 'presídio dos famosos' com consultoria de ex-detentos

A série Tremembé, lançada em novembro de 2025 pelo Prime Video, transformou o Complexo Penitenciário de Tremembé — conhecido como o "presídio dos famosos" — em um palco de ficção crua e bem pesquisada. Baseada nos livros de true crime do jornalista Ulisses Campbell, a produção da Amazon Studios não apenas retrata crimes que chocaram o Brasil, mas questiona o que nos atrai para o sofrimento alheio. Com Marina Ruy Barbosa como Suzane Von Richtofen, Bianca Comparato como Elize Matsunaga e Felipe Simas como Daniel Cravinhos, a série se recusa a ser mero sensacionalismo. E tem um segredo: ninguém falou com os reais condenados.

Zero contato com os condenados — e ainda assim, uma verdade crua

"Zero envolvimento. Nunca falei com nenhuma dessas pessoas", afirmou Vera Egito, showrunner da série, em entrevista ao UOL Splash. A declaração soa quase contraditória diante da precisão dos detalhes: a transferência de Suzane após a rebelião de 2014, seu namoro com Rogério Olberg (interpretado por Vinícius de Oliveira), a costura na prisão, as reuniões evangélicas e até o episódio em que Roger Abdelmassih fingiu estar doente para ser transferido. Tudo isso foi construído com base em autos judiciais, depoimentos públicos e arquivos do Ministério Público, segundo Campbell. "Estamos ficcionando, não fazendo documentário", ele explicou. Mas a diferença entre ficção e realidade aqui é sutil — como um véu de gaze que deixa tudo visível, mas não toca.

A arte de misturar crimes sem dar fama aos desconhecidos

A equipe de roteiristas — que incluiu Campbell, Egito, Juliana Rosenthal, Thays Berbe e Maria Isabel Iorio — fez uma escolha ousada: não limitar os personagens secundários aos criminosos reais. "Você tem uma coadjuvante inspirada em um crime real, mas com características de outra pessoa", disse Campbell. O nome foi trocado, os detalhes foram ajustados. Por quê? Para não glorificar quem não merece fama. Assim, o caso de Alexandre Nardoni foi incorporado sem nomear o personagem, e o romance entre Sandrão, Elize e Suzane — que aconteceu de fato na prisão — foi mantido, mas com nuances que só a ficção pode dar. A consultoria jurídica prévia à produção, confirmada pela Omelete, garantiu que nenhuma acusação falsa fosse feita. Mas foi a consultoria de ex-detentos do próprio Tremembé que trouxe o cheiro da cela, o som das portas metálicas e o silêncio entre os gritos.

Um presídio que virou mito

O Complexo Penitenciário de Tremembé, localizado na cidade de Tremembé, São Paulo, não é só um prédio de concreto e grades. É um símbolo. Um lugar onde o Brasil entrou em crise moral — e depois, em fascínio. Ali passaram Suzane Von Richtofen, Elize Matsunaga, Roger Abdelmassih, Lindemberg Alves — todos ainda presos em 2025, conforme confirmado pela série. E foi ali, segundo o jornal FolhaPE, que o livro proibido Diário de Tremembé — O presídio dos famosos voltou a ser buscado como um artefato proibido. O livro, que nunca foi oficialmente publicado, circulou em cópias manuscritas e PDFs. A série reacendeu o interesse, e com ele, a pergunta: por que nos apegamos tanto a essas histórias?

O gênero que não morre — e por que ele nos assusta

"Mesmo com a grande quantidade de títulos disponíveis, o gênero continua entre os mais assistidos no streaming e no cinema", apontou o Metrópoles. E não é só no Brasil. A série Orange Is the New Black fez sucesso com personagens inventados. Evil Genius nos fez torcer por um ladrão de banco que virou gênio da criatividade. Mas aqui, no Brasil, o que nos prende é a certeza: isso aconteceu. Suzane matou os pais. Elize esquartejou o marido. Roger Abdelmassih abusou de dezenas de mulheres. E agora, vemos como elas vivem — entre orações, costura e olhares que nunca se encontram. A série não pede perdão. Não pede compreensão. Só mostra. E isso é o que assusta.

O que vem depois da série?

O que vem depois da série?

Ainda não há confirmação de uma segunda temporada, mas fontes próximas à produção indicam que a equipe já está reunindo novos casos: o de Marcelo Costa de Andrade, o "assassino do parque", e o de Adriana Almeida, que matou a filha e a entrou em uma vala comum. O interesse do público é tão intenso que o Ministério da Justiça começou a monitorar o impacto da série nas percepções sobre o sistema prisional. Enquanto isso, ex-detentos que ajudaram na consultoria dizem que a série "fez justiça ao silêncio". "Ninguém falou por nós. Agora, alguém falou por nós — mesmo que fosse com atores", contou um ex-presidiário, que pediu para não ser identificado.

Os limites da ficção e o peso da verdade

A grande força de Tremembé está justamente na tensão entre o que é real e o que é contado. Não há música dramática em cenas de violência. Não há close nos rostos dos condenados como se fossem heróis trágicos. Há silêncios. Há olhares vazios. Há o som de uma tesoura cortando tecido — o mesmo que Suzane usava para costurar roupas enquanto pensava no que fez. E isso, talvez, seja o mais perturbador de tudo: não há explicação. Só a evidência.

Frequently Asked Questions

A série Tremembé é um documentário ou uma ficção?

A série é uma ficção baseada em fatos reais. Embora retrate casos verdadeiros como os de Suzane Von Richtofen e Elize Matsunaga, os roteiristas misturaram elementos de diferentes crimes e alteraram nomes de personagens secundários para não dar fama a criminosos menos conhecidos. A produção se baseou em autos judiciais e depoimentos públicos, mas nunca entrou em contato com os condenados vivos.

Por que a série foi feita sem falar com os condenados reais?

A showrunner Vera Egito afirmou que houve "zero envolvimento" com os presos reais para evitar qualquer forma de glorificação ou manipulação de suas histórias. A equipe preferiu usar fontes documentais — como processos do Ministério Público — e a consultoria de ex-detentos para reconstruir o cotidiano prisional de forma ética, sem dar voz a quem ainda está preso.

Quais crimes reais são retratados na série?

A série aborda os casos de Suzane Von Richtofen (assassinato dos pais), Elize Matsunaga (esquartejamento do marido), Roger Abdelmassih (abusos sexuais), Daniel Cravinhos (assassinato da família Nardoni) e Alexandre Nardoni (reconstruído com base em depoimentos). Todos os personagens principais são inspirados em pessoas reais, mas alguns coadjuvantes são fusões de múltiplos crimes.

O livro "Diário de Tremembé" realmente existe?

O "Diário de Tremembé — O presídio dos famosos" nunca foi publicado oficialmente. É um manuscrito circulado entre presos e advogados, com relatos anônimos sobre o cotidiano do presídio. A série reacendeu seu interesse, e cópias digitais começaram a circular novamente nas redes sociais após o lançamento, tornando-o um objeto de culto entre os fãs de true crime.

Roger Abdelmassih e Lindemberg Alves ainda estão presos?

Sim. Conforme confirmado pela série e por registros oficiais do sistema prisional paulista até novembro de 2025, ambos permanecem encarcerados no Complexo Penitenciário de Tremembé. Roger Abdelmassih, condenado por mais de 200 crimes sexuais, ainda aguarda recursos. Lindemberg Alves, condenado por participação no assassinato da família Nardoni, cumpre pena em regime fechado.

Por que essa série reacendeu o interesse por true crime no Brasil?

Porque combina autenticidade com narrativa humana. Ao invés de explorar a violência, a série foca na rotina, nas escolhas, nos silêncios. O público brasileiro já está saturado de crimes sensacionalistas — mas se identifica com histórias que mostram como pessoas comuns se tornam monstros, e como a prisão os transforma em figuras quase mitológicas. É o fascínio pelo que é real, não pelo que é dramático.